segunda-feira, 4 de junho de 2012

Erikson - Desenvolvimento Psicossocial

Á semelhança do que foi feito na publicação anterior vamos analisar outra teoria de desenvolvimento humano, desta vez a teoria de desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson.
Erikson era amigo próximo da família de Freud e de certa forma pode mesmo ser considerado seu discípulo já que a sua teoria herda muitos dos aspetos inovadores introduzidos por Freud, tais como a importância da infância no desenvolvimento do indivíduo, bem como a existência do inconsciente que influencia o comportamento do ser humano. No entanto desmarca-se deste na medida em que faz uso de um conceito mais amplo de desenvolvimento.
Para Erikson a formação da personalidade não pode ser explicada apenas como produto da sexualidade (ver conceito de sexualidade usado na publicação anterior) e das relações familiares, nem termina na adolescência, prolongando-se ao longo de toda a vida. Erikson apresentou assim um modelo de desenvolvimento que considera o Homem como um ser social, influenciado não só pela família mas também pela sociedade, pela cultura e pela relação de pares.
A teoria psicossocial de Erikson é organizada por oito estádios. A passagem por cada estádio é sucessiva mas não tem uma idade cronológica fixa, pois cada individuo tem o seu próprio ritmo de evolução. Cada estádio é marcado por uma "crise", que não tem necessariamente uma conotação dramática, apenas significa um ponto de passagem onde o desenvolvimento segue determinado rumo. A resolução destas crises vai reforçar ou ou enfraquecer o ego definindo assim os traços positivos e negativos da nossa personalidade ao longo da vida.
Para Erikson não existe fixação em nenhuma idade, e se por um lado a forma como cada crise foi resolvida em determinado estádio vá influenciar a passagem pela fase seguinte, por outro lado o ser humano pode passar por experiências positivas ou negativas que contrariem as vivências tidas em estádios anteriores. Dando a entender que a formação da personalidade é um processo dinâmico de ajustamento à vida.

1º Estádio - confiança/desconfiança (0 - 18 meses):
Questão chave - "O meu mundo social é previsível e protetor?"
Neste estádio a relação com a mãe é fundamental e determinante na resolução do conflito. Se a relação for positiva, ou seja com bastante afeto a criança vai-se sentir segura e confiante em si e no mundo. Se por outro lado a relação for negligenciada a criança vai-se sentir insegura.
Erikson mais tarde refinou o seu modelo e referiu que o excesso do reforço positivo pode resultar numa criança demasiado crédula e mimada.
Virtude - Esperança

2º Estádio - autonomia/vergonha e duvida (18 meses - 3 anos):
Questão chave - "Serei capaz de fazer as coisas sozinho ou precisarei da ajuda dos outros?"
Nesta fase a criança começa a ganhar algum controlo e autonomia. É nesta idade que começa a explorar de forma mais ativa o seu mundo. Tem vontade de experimentar e exercitar as suas atividades motoras (correr, saltar, agarrar etc) e começa por exemplo a aprender os hábitos de higiene (usar a casa de banho).
É importante uma educação equilibrada nesta fase, se por um lado um educação bastante rígida que retire a autonomia à criança vai gerar nesta sentimentos de vergonha, por outro lado exigir dela algo para o qual ainda não esta preparada, resultando no fracasso, vai gerar nesta sentimentos de duvida. A criança deve portanto ser incentivada a explorar as suas habilidades de forma equilibrada e deve receber assistência sempre que necessário para não se sentir demasiado exposta. Ou seja deve ser trabalhado um sentimento de auto-controle sem perda de auto-estima.
Virtude - Força de vontade

3º Estádio - iniciativa/culpa (3 - 6 anos):
Questão chave - "Sou bom ou sou mau?"
Este estádio corresponde ao período fálico de Freud. A criança é muito ativa nesta fase, o seu principal propósito é brincar, e a confiança e autonomia que foi adquirindo nos estádios anteriores permitem-lhe agora perseguir os seus objetivos. No entanto muitos desses objetivos (brincadeiras e fantasias) não são aceites socialmente e vão contra as regras que ela já começa a aprender, o que pode gerar sentimentos de culpa. É muito importante dosear bem a punição nesta fase, os pais não podem ser impacientes pois uma educação demasiado severa vai criar sentimentos de culpa, que mais tarde resultam numa pessoa receosa e sem iniciativa. É importante que os pais participem nas brincadeiras das crianças para que elas se sintam valorizadas. Ao mesmo tempo as crianças nesta fase também gostam de ajudar os adultos nas suas tarefas (arrumar a casa etc), ao participarem nestas atividades as crianças vão desenvolver sentimentos de responsabilidade.
Virtude - Tenacidade

4º Estádio - industria/inferioridade (6 - 12 anos):
Questão chave - "Serei competente ou incompetente?"
Este estádio ocorre mais ou menos na mesma fase em que a criança inicia a aprendizagem sistemática na escola formal. As competências adquiridas nas três fases anteriores (confiança, autonomia, iniciativa), vão permitir uma boa resolução da crise deste estádio, já que a criança vai sentir prazer no trabalho que está a realizar. Por outro lado uma má resolução nos estádios anteriores irá provavelmente prejudicar a aprendizagem nesta fase tornando-a alvo de criticas por parte dos pares, o que resulta num sentimento de inferioridade.
Virtude - Competência

5º Estádio - identidade/confusão de identidade (12 - 18/20 anos):
Questão chave - "Quem sou eu, e o que vou fazer da minha vida?"
Erikson dá especial importância a esta fase, pois é nesta idade que o adolescente define o seu papel na sociedade e se assume como um individuo com características especificas que o tornam único. A interação social assume uma enorme importância nesta fase, pois só experimentando vários papeis e pondo em causa os seus próprios valores, é que o adolescente vai perceber quem é e no que se quer tornar. A relação de pares tem uma grande influência na construção da identidade, o adolescente procura ser aceite no grupo de amigos e percebe que existem determinados "pré-requisitos" para que isso seja possível.
A identidade só fica definida quando o adolescente se vê como um ser único e que essa unicidade é reconhecia pela sociedade adulta.
Virtude - Lealdade/Fidelidade

6º Estádio - intimidade/isolamento (18/20 - 30/35 anos):
Questão chave - "Deverei partilhar a minha vida com alguém, ou deverei viver sozinho?"
Uma boa resolução no estádio anterior facilita a resolução da crise desta fase. Se o jovem adulto tiver um identidade bem definida será mais fácil identificar-se com um par. No entanto isto não é suficiente pois embora a sua identidade não seja comprometida nesta fase, este tem de reconhecer as diferenças do par aceitando os seus defeitos, e por vezes fazer mesmo algumas alterações e ajustamentos no seu comportamento, de forma a estabelecer um compromisso atingindo assim a verdadeira intimidade.
Quando o individuo não consegue estabelecer esta intimidade corre o risco de se fechar em si próprio e cair no isolamento.
Virtude - Amor/Afiliação

7º Estádio - generatividade/estagnação (30/35 - 65 anos):
Questão chave - "Produzirei algo com valor, útil para mim e também para os outros?"
É neste estádio que por vezes ocorre a famosa crise da "meia idade". O adulto começa a preocupar-se com o que pode passar para a sociedade, seja através da educação dos filhos ou do resultado do seu trabalho. Se tudo correr bem o adulto sente-se bem por ter uma mensagem a passar para gerações seguintes e transforma-se num empreendedor, em caso de uma má resolução desta crise o sujeito acaba por estagnar centrando-se apenas no seu bem estar a em valores superficiais.
Virtude - Produção/Cuidado

8º Estádio - integridade/desespero (a partir dos 65 anos):
Questão chave - "Valeu a pena viver?"
O ultimo estádio de desenvolvimento humano. É feito o balanço de tudo o que foi feito e de tudo o que ficou por fazer. Nesta altura já não sobra muito tempo para mudanças ou perseguição dos sonhos. Se o balanço for positivo surge a sensação de vida preenchida, de que tudo valeu a pena e a missão foi cumprida. Por outro lado se o balanço for negativo e devido à falta de tempo para começar de novo surge um vazio e um sentimento de vida desperdiçada, dando lugar ao desespero.
Virtude - Sabedoria

Conclusões Gerais

Certamente que todos queremos uma sociedade constituída por indivíduos confiantes, autónomos e com capacidade de iniciativa, que encontrem o seu espaço no meio onde vivem, que saibam respeitar o próximo sem preconceitos e que contribuam de forma ativa e empreendedora para o desenvolvimento do mundo em que vivemos. Pois bem, Erikson atribuiu ao ego todos estes valores universais e ao considerar o desenvolvimento da personalidade humana como sendo de ordem psicossocial, significa que todos nós por um lado já  temos alguma influência na formação da personalidade das pessoas com quem nos relacionamos, mas como futuros treinadores/professores iremos ter uma responsabilidade acrescida nesse processo.
É importante no nosso clube ou na nossa escola saber identificar em que fase é que os nossos alunos/atletas se encontram e tentar proporcionar um ambiente positivo para o enriquecimento do ego. Por exemplo vamos imaginar que estamos a trabalhar com crianças entre os 6-12 anos, talvez a maioria dos treinadores comece mesmo por esta faixa etária, é importante promover um sentimento de competência para que o conflito interior desta idade seja bem resolvido e a entrada na adolescência esteja facilitada. Para que isto seja possível já sabemos que temos de proteger a criança das criticas dos colegas não exigindo dela algo para o qual ainda não está preparada, e propor-lhe exercícios com um grau de complexidade adequada de forma a que ela possa ver a sua própria evolução e sentir-se capaz, competente e com valor.
O desporto como acto social assume um papel importante na formação da personalidade do ser humano. Os atletas não são máquinas e por esse motivo o treino não pode ser igual para todos. Não pode haver mais lugar para o treinador que apenas se preocupa com o rendimento desportivo dos seus atletas, ignorando as consequências que os seus métodos de treino podem ter no desenvolvimento do ser humano.

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